19.10.08

Carta a um radialista do PIG

Abaixo, publicamos a carta que o Secretário Geral do CPERS encaminhou ao programa de rádio "Sala de Redação". Espanta-nos que um sindicalista confesse que dá audiência a um programa transmitido pela empresa de mídia que foi a grande articuladora da chegada de Yeda Crusius ao poder no RS.
Esse é mais um dos "programas", onde se faz a legitimação de todo esse estado de coisas que ora presenciamos e que o Secretário descreve em sua carta.
Os participantes, nitidamente conservadores, completamente despreparados para fazer uma análise conjuntural do que quer que seja, palpiteiros, "emitem opinitões" sem o menor fundamento e conhecimento de causa.
Uma afirmação canalha como a de que o movimento sindical quer produzir um cadáver para jogá-lo nas portas do Piratini só poderia sair da cabeça de gente descerebrada e mau caráter. Uma trabalhadora, mãe de família, miliante política, iria para uma manifestação com a intenção de se imolar numa batalha campal com uma polícia fascista?
Será que o Secretário percebe o quanto é degenerada a pessoa que levantou essa hipótese? Será que o Secretário percebe o quanto esse tipo de afirmação cala fundo na visão que uma população desinformada, como a nossa, tem da realidade?
Isso, caro Secretário, chama-se formação de subjetividade, onde, num jogo de palavras, as vítimas são transformadas em algozes e os algozes transformados em vítimas. E o mais chocante é que, depois de ouvir essas aberrações, o Secretário ainda afirma que gosta do programa!
Enquanto houver sindicatos e sindicalistas assinando ZMentira, dando audiência para rádio e TV da mídia corporativa e sendo incapazes de identificá-la como o inimigo de classe mais insidioso de todos, assistiremos a toda ordem de tropelias contra o estado de direito.
A mídia corporativa é uma mera extensão do poder que está instalado no Piratini. E não seria nenhum exagero dizer, que, na verdade, o tipo de poder que se instalou no RS é uma extensão do poder e dos interesses da mídia.
Melhor faria o Secretário, se conclamasse os seus pares a um boicote à mídia corporativa, atingindo-a naquilo que é o seu ponto mais vulnerável: o interesse econômico. Uma campanha, por exemplo, de cancelamentos de assinatura de ZH, porque temos certeza que muitos sindicalizados assinam esse pasquim, produziria um resultado muito mais eficaz e imediato que mil cartas como essa enviadas ao tal sala de redação.

Assunto: Aos cuidados do "Sala de Redação"
Data: Sábado, 18 de Outubro de 2008, 20:16
Senhores radialistas do “Sala de Redação” da Rádio Gaúcha
Ouvi, de um dos senhores no programa da última 6ª feira, o comentário de que os movimentos populares e sindicais queriam uma vítima entre os participantes da Marcha dos Sem de 16 de outubro, para usá-la como trunfo contra o governo. Esta afirmação fantasiosa, ofende o movimento dos trabalhadores. Não agimos assim. Somos lutadores e não oportunistas. Não queremos e não precisamos de feridos e muitos menos de mortos para divulgar as nossas idéias.
Mas vamos denunciar sempre as agressões contra os trabalhadores.
Passo, aos senhores, duas fotos feitas no dia 16 de outubro, que mostram a nossa colega Marli Helena Kümpel da Silva, Diretora do Núcleo de Erechim do CPERS, ferida pela explosão de uma “bomba de efeito moral”, como são chamadas eufemisticamente e com impropriedade estes artefatos, tanto pela Brigada Militar como pela imprensa. O impacto em Marli foi direto, deixando-a com uma fratura exposta na perna. Nossa colega, ainda agora, encontra-se em recuperação no Hospital Ernesto Dornelles.
Marli é uma dirigente do CPERS e participa do nosso Conselho Geral. Não queremos nossos dirigentes fora de combate ou imolados em sacrifício. Queremos todos vivos e saudáveis, dirigindo a luta dos educadores.
A Brigada Militar jogou de forma covarde, três bombas sobre a passeata, o suficiente para ferir 17 pessoas, a maioria na cabeça, com cortes feitos pelos estilhaços e queimaduras pela pólvora, o que por si só atesta o alto poder explosivo dos artefatos.
Quem está querendo fazer vítimas? Será que não está claro?
Foi afirmado, no “Sala de Redação”, que poderíamos ter feito uma concessão, e falado de onde foi detido o carro de som, abrindo mão de chegar ao Palácio Piratini. Mas, porque teríamos que fazer esta concessão? Vejam nossas razões:
A “Marcha dos Sem” é uma tradicional manifestação unitária dos movimentos sindicais e populares do Rio Grande do Sul, que se repete todos os anos, desde 1995, terminando sempre em frente ao Palácio Piratini, quando então é entregue uma carta reivindicatória dos participantes ao Governador do Estado. Será que não dá para compreender e aceitar o significado simbólico desta manifestação?
Em 13 anos, nunca aconteceu nenhum incidente. Desta vez, a Marcha do Sem foi reprimida com selvageria pela Brigada Militar, a poucos metros da Catedral Metropolitana, do Palácio Piratini e da Assembléia Legislativa, quando chegaria então ao seu final. O que temiam o Governo Estadual e a Brigada Militar? Era a paranóia de sempre com o MST? Saibam que a maior parte dos 17 feridos na Praça da Matriz, eram educadores, filiados ao CPERS.
Depois da manifestação, com a Praça da Matriz esvaziada, um policial militar recolhia dos canteiros alguns pequenos galhos apodrecidos de jacarandá, daqueles que se quebram com facilidade, ali caídos, e algumas pedras portuguesas soltas na calçada. Depois mostraram para a televisão aquelas “armas” dizendo que haviam sido usadas contra a Brigada Militar. Uma farsa. Os achados foram feitos exatamente no local onde estavam os manifestantes, e não no trecho da Rua Duque de Caxias, onde haviam estado antes os policiais militares, e onde deveriam estar as pedras caso tivessem sido arremessadas contra os soldados.
Quero ainda lembrar que, em 16 de setembro, o BOE e a cavalaria da Brigada Militar investiram contra uma manifestação do CPERS, que buscava uma audiência com a governadora, agredindo com violência a categoria e a Diretoria do Sindicato.
Será o destino do Rio Grande do Sul ser transformado em um estado policial militar, onde a questão social é tratada como questão de polícia, como era na República Velha e na ditadura, onde sindicalista era tido como “baderneiro”?
Atentem na repressão que está sendo desencadeada contra os movimentos sindicais e populares. Ela já está fora de controle e representa uma ameaça às liberdades democráticas.
Gosto muito do “Sala de Redação”, até mesmo quando o programa transcende o futebol e os senhores falam da realidade em que vivemos, mas faço um apelo para que não ignorem os argumentos daqueles que lutam pelos seus direitos.
Em 18/10/2008
CLOVIS CARNEIRO DE OLIVEIRA
Secretário Geral do CPERS-Sindicato

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