12.10.09
RBS e Incra/RS se aliam para combater o MST
Novos aliados fazem devassa policial e lavram sentença criminal simbólica contra o movimento social
Várias obras literárias e cinematográficas exploraram o argumento da prostituição embalada no celofane brilhoso da moral. É um truque manjado e fácil esse de tratar dos contrastes num tipo humano que já foi o paradigma burguês da indecência e da imoralidade. Foi. Hoje, os concorrentes são multitudinários. "Nunca aos domingos" é um filme dessa classe. Um grande filme de Jules Dassin, lançado em 1960, com a grega Melina Mercouri, no papel da prostituta que guardava o dia santificado. [Ver nas locadoras.]
Corte rápido.
Em 1998, foi lançado pela editora da Ufrgs, a obra "Campos em confronto: a terra e o texto", da professora e pesquisadora Christa Berger. O livro resulta de sua tese de doutorado na Escola de Comunicações e Artes da USP, em 1996. Trata, em suma, da relação do jornal Zero Hora (grupo RBS) com o MST. Embora não tenha sido essa a intenção da professora Berger, o estudo dela mostra o quanto são envenenadas - por parte de ZH - essas relações. De um lado temos um meio de comunicação social porta-voz da hegemonia (Sartre dizia que as mídias desempenham o papel de "servidores da hegemonia e guardiães da tradição"), e do outro, temos um movimento social muito dinâmico e febril que situa-se na vanguarda da luta contra-hegemônica no Brasil - queiram ou não os que têm uma vida absolutamente regulada, previsível e cultivam pruridos contra os métodos hiperrealistas (e necessários) de luta do movimento.
"Campos em confronto" constata que o jornal Zero Hora, pelo menos até 1998, não publicava nada aos domingos, contra o MST. Nem a favor. Como a prostituta do Pireu, nunca aos domingos!
Não sei quando se deu essa dissolução moral de ZH, mas já faz alguns anos que o jornal da família Sirotsky dedica comumente os domingos para bater no MST. Não passa mês, que não saia matéria com pancadaria no movimento.
Hoje, neste belo domingo ensolarado de primavera, para o MST, entretanto, faz tempo feio em ZH. Desta vez, o jornal da Azenha tratou de buscar um parceiro para melhor bater no movimento dos sem terra: o Incra (Instituto Nacional de Reforma Agrária), secção do Rio Grande do Sul. Todos os argumentos e informações manipulados pelo jornal nessa matéria foram extraídos do Incra/RS, a partir de uma denominada "devassa no assentamento da fazenda Annoni". Não está informado no texto, mas é possível perceber pela narrativa do mesmo que o Incra/RS convidou a reportagem de ZH para acompanhar a chamada "devassa" no assentamento. O tom da matéria é ameaçador e policialesco, menciona-se que a área dos assentados será "vasculhada", "que está sob investigação", "devassa nas terras", "suspeita de crimes ambientais", "alvo de uma ação quase policialesca", "avisar as autoridades policiais", etc.
Se pode observar nitidamente que o Incra/RS está exorbitando da sua função pública. Antes de qualquer constatação formal de irregularidades na área do assentamento, o órgão federal, subordinado ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, faz-se acompanhar pela reportagem de um jornal, e se arroga no direito de deter o poder de polícia e o de juíz, ao mesmo tempo. Assim, a aliança RBS-Incra/RS acaba constituindo uma devassa policial e um julgamento seguido de sentença informal aos olhos dos leitores dominicais de ZH.
O assentamento da Annoni foi efetivado em 1985, desde então o jornal ZH tem feito inúmeras matérias sobre o MST, as ocupações, as desocupações (sempre violentas da BM), etc. Em cálculo estimado chegam a quase mil matérias feitas por ZH sobre o MST, desde então, quase sempre por esse mesmo repórter da edição de hoje, agora especialista às avessas em MST. Essas matérias têm em comum, além do mesmo objeto (falar mal do MST), o fato de serem tramadas e costuradas com o fio invisível do discurso ideológico. Ora, esse discurso é a própria fala da lógica do poder econômico no seu afã de aplastar com imagens simbólicas a luta empreendida pelos que buscam a emancipação política e social. Porém, na edição de hoje, há uma novidade que surpreende e assusta: o Incra/RS presta-se a colaborar com a cruzada histórica que o grupo midiático RBS empreende há 25 anos contra o movimento social, em nome de uma posição de classe que procura apontar a luta dos excluídos como algo criminoso e moralmente reprovável.
À falsa moralidade das prostitutas idealizadas pelo cinema e a literatura, acrescente-se agora o moralismo policialesco e as falsas sentenças criminais-espetaculosas dos novos aliados RBS-Incra/RS.
Fonte: Diário Gauche
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